Qual o projeto de país definido pelo arcabouço? *Gilberto Maringoni* outraspalavras.net/mercadovsd… Leia com atenção!

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Discurso do Senador Requião sobre economia e momento político atual

Vai-se a primeira pomba despertada… Vai-se outra mais… mais outra… enfim dezenas de pombas vão-se dos pombais, apenas raia sanguínea e fresca a madrugada… E à tarde, quando a rígida nortada Sopra, aos pombais de novo elas, serenas, Ruflando as asas, sacudindo as penas, Voltam todas em bando e em revoada… Também dos corações onde abotoam, Os sonhos, um por um, céleres voam, Como voam as pombas dos pombais; No azul da adolescência as asas soltam, Fogem… Mas aos pombais as pombas voltam, E eles aos corações não voltam mais. Com esta poesia de Raimundo Correa, como preâmbulo, faço aqui um balanço de minha atuação neste primeiro ano de mandato como Senador do Paraná. Vai-se parte da 54ª Legislatura do Senado Federal. Foi ótima ou boa? Foi regular? Foi ruim ou péssima? Confesso que não saberia responder a pesquisa. Talvez refugiasse no conforto do regular. Nem cá e nem lá, tudo mais ou menos. Embora de bancada que compõe a base do governo, em algumas votações chaves votei contra o governo. Por exemplos, Salário Mínimo e boa parte das Medidas Provisórias. Quando não, fui o único voto discordante, em votações em que oposição e governo deixaram de lado as divergências circunstanciais que os aparta, para produzirem equívocos quase unânimes. A ministra Ideli Salvatti fez uma boutade sobre o meu posicionamento. Disse que no Senado há a situação, a oposição e o Requião. Nem é bem assim, embora seja verdade que, com freqüência, sinta solidão em minhas opções e, com freqüência, quase ceda ao desânimo. Em meu primeiro discurso, em fevereiro, disse que temas concentrariam o meu trabalho. Ao longo da legislatura, mantive-me fiel ao compromisso, sem medo de ser repetitivo, monocórdio. Sem o adjetivo provocativo de James Carville, insisto: é a economia, senhoras e senhores senadores, é a economia. De resto, o resto vem por acréscimo. Em fevereiro, desta tribuna, deplorava que o governo federal, diante dos sinais tão claros de que a crise financeira global não arrefecera -porque os pressupostos que a provocara não haviam sido removidos- deplorava que o governo federal teimasse em destilar, em gotejar medidas para proteger o país dos efeitos da crise, quando a realidade exigia decisões mais duras, mais incisivas; quando, enfim, vez da prudência homeopática, exigia-se a urgência, a emergência de doses fortes de remédios fortes. Algumas medidas agora anunciadas deveriam ter sido tomadas lá em janeiro, lá em fevereiro, em março, no máximo. No entanto, mais poderosas que os interesses nacionais, mais influentes que a vontade, que as intenções e as decisões presidênciais impuseram-se as vozes do mercado. E eis as conseqüências: declínio do consumo, crescimento zero no terceiro trimestre, aumento da inadimplência, desaceleração industrial, com o conseqüente recuo no número de vagas de trabalho no setor e a diminuição do valor da folha de pagamento real, e queda nos índices de reajustes salariais, que passaram a não incorporar ganhos de produtividade. De todo modo, enquanto isso, anuncia-se que aumentou o número de milionários brasileiros, cuja quantidade deve dobrar, até 2016. Quem são esses venturosos senhores ou senhoras infensos aos tormentos da conjuntura? Seriam eles agricultores, industriais, comerciantes, profissionais liberais, jogadores de futebol? Não, não e não. São especuladores, são rentistas, são banqueiros. São, por exemplo, os seletos sócios do mercado de “private banking” brasileiro, que hoje movimenta 430 bilhões de reais e que projeta alcançar 1 trilhão de reais, até 2016. São os filhos dos juros. São os proxenetas do capital vadio. A OCDE -Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, aponta que, depois de décadas de desregramento neo-liberal, cresceu, acentuadamente, nos últimos 30 anos, a distância entre ricos e pobres. E recomenda o aumento da taxação sobre os mais ricos como forma de reduzir o hiato que se alarga. Eu cá pergunto: aumentar o que, cara pálida, se aqui, nesses trópicos , é dos usos e costumes, desde sempre, taxar o pobre e isentar o rico? Senhoras e senhores senadores. Há uma clara dicotomia no Brasil desses dias anuviados. A distância entre o discurso e a prática. A distância ,como diria o poeta, entre a intenção e o gesto. Os discursos da presidenta Dilma e do ministro Mantega tocam-me o coração, reconfortam-me a alma. Eles revelam clara apreensão das raízes da crise, dos males causados pelo cancelamento de qualquer restrição às ações do mercado. Demonstram o entendimento de que a prevalência da especulação sobre a produção, da banca sobre a fábrica aguça, prolonga a crise. Proclamam que a defesa do emprego, o incentivo ao consumo e o corte dos juros, combinados com o aumento dos investimentos públicos e estímulos aos investimentos privados são essenciais para fazer o país crescer e preservar-se da contaminação da crise mundial. Belos discursos. Belos discursos que se transformam em palavras ao vento à medida que a prática se revela outra. E os investimentos públicos? De janeiro a novembro, os investimentos do governo federal, em comparação com o mesmo período em 2010, encolheram 16,5 bilhões de reais. Triunfaram as opções conservadoras; ou seja, preocupado com a inflação, o governo enxugou os investimentos. Havia a opção de reduzir o superávit primário, por exemplo. Mas aí os gênios da lâmpada perguntaram-se aflitos: “Se fizermos concessões na solidez fiscal, nos sagrados pressupostos que fundamentam a nossa política econômica, como reagirá o mercado?”. Reverentes ao mercado, genuflexos diante do altar da especulação, sacrificaram os investimentos e preservaram o superávit primário. Quando se abre mão dos investimentos para a manutenção do rigor fiscal, abdica-se do crescimento, aceita-se um PIB raquítico, admite-se o aumento da taxa de desemprego, conforma-se com a diminuição dos salários. No início do ano, Guido Mantega dizia que a dita austeridade fiscal seria mantida e que os investimentos públicos iriam crescer. Como a austeridade foi mantida e os investimentos caíram, quem é que pagou o pato? E, por esses dias, ouço o ministro da Fazenda dizer que, para a economia crescer, o governo depende de investimentos privados. No que rebate o presidente da Confederação Nacional da Indústria, Robson Andrade: para a economia crescer, o setor privado precisa que o governo invista em infra-estrutura e faça algumas concessões na política econômica. Como até agora não vimos sinais de uma e outra coisa, a não serem pálidas e tímidas medidas, é de se preocupar como o ano que se aproxima. E os nvestimentos privados? O senador Armando Monteiro, desta tribuna, dias atrás, revelou-nos dados que deveriam despertar de vez o Congresso para a realidade de nosso país hoje. Ouçam o que ele disse: enquanto a balança comercial brasileira apresentava, até novembro, um superávit de 26 bilhões de dólares, a balança comercial dos manufaturados, tomada isoladamente, escancarava um déficit de 86 bilhões de dólares, com a previsão de fechar o ano com um rombo de 94 bilhões de dólares. Em apenas cinco anos, de 2006 a 2011, esse déficit pula de seis bilhões de dólares, para 96 bilhões de dólares. Senhoras e senhoras senadores, a produção industrial brasileira está indo pelo ralo. A primarização da economia, condicionando-nos a exportadores de grãos e minérios, e importadores de produtos acabados, não é mais uma ameaça ao nosso futuro. É realidade. Não é de hoje que o ritmo, a velocidade do setor industrial vem desacelerando, marcando passo, quase parando, colocando em risco nossa plataforma fabril, desempregando, exportando empregos e renda. A retomada não se faz de uma hora para outra, em um estalo de dedo. No entanto, afora uma que outra reação, como a do senador Armando Monteiro, as sempre oportunas advertências do senador Francisco Dornelles, e as intervenções dos senadores Cristovam e Aloysio, vibram, soam e ressoam com freqüência por essas paredes espelhadas louvaminhas, reverências, salamaleques aos tais “sólidos fundamentos macroeconômicos”, “aos acertos das medidas tomadas pela presidenta Dilma e pelo ministro Guido Mantega”, “a magnificência dos números”, e coisa e tal. Não é diferente a reação da bancada oposicionista. Não vejo da parte dela, também, qualquer antagonismo à política econômica em curso. Afinal, a oposição acusa a situação de plágio, de usar, no governo, um software pirata. Sendo assim, sendo a oposição a legítima formuladora desses equívocos, não há porque esperar dela qualquer reação aos equívocos. Ela é ciosa do que gerou. E os salários e o consumo? Leio nos jornais que o Dieese e algumas empresas de consultorias estimam para este semestre que os aumentos salariais não vão obter índices acima da inflação, e que os trabalhadores não organizados em sindicatos ou liderados por sindicatos fracos, vão ter dificuldades para obter índices que pelo menos reponha a inflação. Ganhos de produtividade, adeus. Enfim, nada de novo. Quando, em fevereiro, defendi um salário mínimo maior que o proposto pelo governo e votei contra a proposta do governo, guiava-me a percepção de que a crise iria aprofundar-se e que, antecipadamente, deveríamos garantir um ganho maior aos trabalhadores, vítimas preferenciais da crise financeira global. Todos nós sabemos – e se não atentamos para o fato é uma lástima- que a distância, que o fosso cavado entre o salário e a produtividade está na origem da crise financeira que espocou e estilhaçou a economia mundial a partir de 2008. Será que é tão difícil assim absorver as lições da história? Se o governo segura o salário mínimo sinaliza ao mercado a trilha a seguir. A contenção dos salários, o decréscimo dos aumentos salariais corre paralelo com a elevação da inadimplência. Em média, estima-se que o endividamento das famílias brasileiras atinja 50 por cento do que ganham. Não precisa ser nenhum diretor do Banco Central ou nenhum desses geniais consultores para perceber que isso é uma bomba de fortíssimo poder destrutivo. A ditadura da banca, que submete e humilha portugueses, espanhóis, irlandeses, italianos e gregos, que se acumplicia com os governantes da Alemanha, França e Inglaterra, que faz do presidente Obama um presidente pusilânime e amedrontado, quando não submisso, não vai deixar o Brasil fora de seu alcance só com discursos ou bravatas. O voluntarismo não leva a nada. Muito menos o otimismo que se estrutura no vazio. O otimismo declaratório, quando não, declamatório. Não existe outra saída a não ser apoiar-se e acreditar nas próprias forças. O medo servil, que faz duvidar da possibilidade de libertar-se, que resiste à idéia da emancipação, o sabugismo colonial que se conforma ou aprecia a submissão, a espinha sempre recurva aos interesses alheios e essa contrafação marota, oportunista do internacionalismo, que não vê mais espaço às nações, aos projetos e sonhos nacionais são três vertentes da mesma fonte: a mediocridade. Não vamos a lugar algum se não tivermos a coragem de radicalizar. Radicalizar na defesa do salário e do emprego; radicalizar na defesa da indústria nacional; radicalizar no corte de juros e impostos; radicalizar na defesa da moeda, no controle do câmbio; radicalizar na regulamentação do mercado financeiro, com rígidas, duras medidas de restrição à especulação; radicalizar ao ponto da intervenção nas atividades da banca, toda vez que os bancos sobreponham seus interesses aos interesses da economia nacional, da produção, do emprego e da segurança econômica dos brasileiros. Quanto a isso, a quem torcer o nariz à minha proposta, lembro do que aconteceu em 2008, quando arrebentou a crise. O presidente Lula, para que a banca irrigasse a economia de créditos, fazendo-a girar, liberou o compulsório. Que fez a banca? Aplicou os recursos liberados em Letras do Tesouro e deu uma banana para quem precisasse de crédito para produzir, comprar ou vender. Uma banana para o país, esse a resposta da banca. Radicalizar para crescer. Radicalizar para desenvolver. Radicalizar para viver. Radicalizar para existir como nação soberana, próspera, solidária, boa e justa para todos. Senhoras e senhores senadores. Espero que no próximo período desta Legislatura concentremos nossas energias no que interessa: na economia. Assim farei. Nem que clame no deserto deste plenário, no deserto desta Esplanada dos Ministérios, no deserto desta Praça dos Três Poderes.