O senador Roberto Requião está apresentando, com o apoio de deputados e senadores, Projeto de Decreto Legislativo que suspende a vigência de um decreto federal de abril deste ano que estabelece novas etapas para o desmonte da Petrobras e faz novas concessões às transnacionais do petróleo. Veja a seguir ao projeto de Requião e conheça a opinião do engenheiro Fernando Siqueira, da Associação dos Engenheiros da Petrobrás sobre o assunto.
por Fernando Siqueira:
“Decreto de Temer é para desmontar Petrobrás”
“É a derrocada total porque já havia o decreto 9188/2017, [que permite ‘adoção de regime especial de desinvestimento de ativos pelas sociedades de economia mista federais’]. Esse decreto baixado agora, valida o fato do Parente ter vendido ativos sem concorrência e valida vendas futuras. É um processo acelerado de desmonte do país e de sua principal locomotiva, que é a Petrobrás”, afirmou o vice-presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (Aepet), Fernando Siqueira, ao analisar o decreto 9.355/2018, que regulamenta a venda de campos e blocos de petróleo pela Petrobrás.
Siqueira destacou como um dos principais pontos nocivos ao país o artigo 4º do decreto, que diz em seu parágrafo único, inciso 1, que serão observados “os direitos de preferência de parceiros da Petrobras nos objetos de cessão de direitos” de exploração e produção, isto é, as empresas que Parente chama de “parceiras” terão preferência na compra de campos de petróleo da estatal.
“Essas empresas ‘parceiras’ são do cartel do petróleo. Exxon, Shell, BP, Total. Quando se fala em dar atenção a esses ‘parceiros’ é porque eles serão os preferidos no processo de entrega do petróleo do pré-sal. O campo de Lula [ex-Tupi] tem ‘parceria’ com essas empresas. Tem o campo de Libra, que tem ‘parceria’ com Total e Shell. O campo de Carcará foi vendido para a [estatal norueguesa] Statoil. Fatias nos campos de Lapa e Iara foram vendidas para a Total a um preço extremamente baixo”, disse.
“A Petrobrás já descobriu em torno de 50 bilhões de barris de petróleo no pré-sal. Com mais o que tem a descobrir, dá mais que o dobro da reserva norte-americana, hoje. Com esse Petróleo, se faz uma política de aproveitamento como fez a Noruega, o Brasil dispararia como o país mais desenvolvido do mundo e isso não interessa aos Estados Unidos. Esse processo de entrega do pré-sal destrói mais uma esperança de desenvolvimento do povo brasileiro. Nós tivemos a Era do ouro, a Era da borracha e agora nós estamos abrindo mão da Era do petróleo. Isso é uma covardia imensa com o nosso país“, acrescentou Siqueira.
Para o engenheiro, um ponto importante é que “empresa multinacional não desenvolve o país, não gera mão-de-obra no país. Estrategicamente, é um desastre. Eu sempre cito o exemplo da Noruega, que já foi o segundo país mais pobre da Europa. Descobriu petróleo no Mar do Norte, explorou e produziu ela mesma e se tornou um dos maiores países desenvolvidos do mundo. Nos últimos cinco anos, com maior IDH [Índice de Desenvolvimento Humano]. Na mesma época, a Nigéria descobriu mais petróleo que a Noruega, entregou para a Shell e continuou na miséria”.
Ele sublinhou que o pré-sal tem tudo para transformar o Brasil em uma Noruega gigante: “Mas, no que jeito que a coisa está, com a entrega do petróleo para as multinacionais, o Brasil vai ser uma enorme Nigéria. Não vai ter vantagem nenhuma para o povo brasileiro. O conteúdo local vai ficar altamente prejudicado, porque as empresas multinacionais tendem a comprar em seus países de origem. Você não gera emprego, não gera tecnologia e não usufrui dessa riqueza”.
Refinarias
De acordo com Siqueira, a venda de campos de petróleo e de refinarias, já anunciada por Parente, é ruim para o Brasil e para a Petrobrás, que irá se tornar em mera empresa exportadora de petróleo. “Isso é um crime de lesa-pátria continuado, cometido por um governo formado por uma quadrilha de corruptos que está vendendo o país. O Temer foi ao exterior para isso. Também o Moreira Franco, o Eliseu ‘Quadrilha’, o Romero Jucá, toda uma plêiade de bandidos que não tem nenhum compromisso com a nação, que só querem ganhar polpudas comissões”, frisou.
O vice-presidente da Aepet ressaltou ainda o art. 5º do decreto. Ele estabelece que a condução da venda de campos de petróleo será feita pelo conselho de administração, que no dia 26 de abril teve sua composição alterada em assembleia de acionistas. Como maior acionista controlador, a União – leia-se governo Temer – indicou oito conselheiros. Entre os quais, Pedro Parente; José Alberto de Paula Torres Lima, 27 anos de Shell; Clarissa de Araújo Lins, também da Shell e do IBP, instituto que reúne as multinacionais; e Ana Lucia Poças Zambelli, de empresas estrangeiras prestadoras de serviços no setor, como a Transocean.
Shell
No mesmo dia, o conselho de administração aprovou a recondução dos seis diretores executivos. Na diretoria de Estratégia, Organização e Sistema de Gestão, Nelson Luiz Costa Silva, egresso da Britsh Gas, subsidiária da Shell, e que foi presidente mundial de Alumínio da anglo-australiana de mineração BHP Billiton. Na diretoria financeira e de Relacionamento com Investidores, Ivan Monteiro. “Ele foi alçado ao cargo por Aldemir Bendine, que se encontra preso. Desde o governo Dilma, ele fez três impairment (desvalorização de ativos) da Petrobrás, num total de R$ 113 bilhões. Em 2014, ele fez uma desvalorização de R$ 48 bilhões. Em 2015, a Petrobrás teve um lucro bruto de R$ 98 bilhões e um lucro líquido de R$ 15 bilhões. Foi feita uma desvalorização de R$ 49 bilhões. Então, a Petrobrás ficou com um rombo virtual de R$ 34 bilhões. Isso teve duas conseqüências: convencer a população que era preciso vender ativos porque a Petrobrás estava quebrada e desvalorização de ativos a serem vendidos. O Ivan Monteiro já veio com a finalidade de vender ativos. Juntando a fome com a vontade de comer, o Parente o manteve na diretoria”, concluiu Siqueira.
Fonte: Hora do Povo
PROJETO DE DECRETO LEGISLATIVO Nº , DE 2018
Susta o Decreto nº 9.355, de 25 de abril de 2018.
O Congresso Nacional decreta:
Art. 1º Fica sustado o Decreto nº 9.355, de 25 de abril de 2018.
Art. 2º Este decreto legislativo entra em vigor na data de sua publicação.
JUSTIFICAÇÃO
A participação das empresas estatais na exploração da atividade econômica deve ser pautada por relevante interesse coletivo ou imperativos de segurança nacional, para atingir os objetivos de garantir o desenvolvimento nacional e reduzir as desigualdades sociais e regionais, entre outros, como estabelece nossa Constituição Federal.
A administração pública indireta, em que se inserem as empresas estatais, deve obedecer aos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. A necessidade geral de licitar é imprescindível nesse sentido, inclusive para as empresas públicas e sociedades de economia mista.
De acordo com o art. 173, §1º, da Constituição Federal, a lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo inclusive sobre licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações.
A Lei nº 13.303, de 30 de junho de 2016, conhecida como Estatuto Jurídico das Empresas Estatais, regulamentou o art. 173, §1º, e dispôs sobre o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
O § 5º do art. 1º da Lei nº 13.303/2016 é claro ao definir que, para a empresa pública e a sociedade de economia mista que participem de consórcio na condição de operadora estão submetidas às regras de licitação previstas no Estatuto Jurídico das Empresas Estatais, como se lê:
- 5º Submetem-se ao regime previsto nesta Lei a empresa pública e a sociedade de economia mista que participem de consórcio, conforme disposto no art. 279 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, na condição de operadora.
Nos termos do art. 28 da Lei nº 13.303/2016, os contratos com terceiros destinados à prestação de serviços às empresas públicas e às sociedades de economia mista, inclusive de engenharia e de publicidade, à aquisição e locação de bens e à alienação de bens e ativos integrantes do respectivo patrimônio serão precedidos de licitação.
Dessa forma, as contratações de bens e serviços efetuadas pelos consórcios operados pela Petrobras e a cessão, pela estatal, de direitos de exploração, desenvolvimento e produção de petróleo e gás natural devem ser precedidas de licitação, assim como o processo licitatório deve observar as exigências estabelecidas pela Lei nº 13.303/2016.
O art. 1º do Decreto nº 9.355, de 25 de abril de 2018, estabelece procedimento especial de cessão de direitos de exploração, desenvolvimento e produção de petróleo e gás natural pela Petrobras, na forma estabelecida no art. 29, no art. 61, caput e § 1º, e no art. 63 da Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997, e no art. 31 da Lei nº 12.351, de 22 de dezembro de 2010.
Importa ressaltar que: o art. 29 da Lei nº 9.478/1997 apenas permite a transferência do contrato de concessão; o art. 61, caput e § 1º, trata, basicamente, de impedir favorecimento à Petrobras na aquisição de direitos relativos à atividade petrolífera; e o art. 63 apenas autoriza a Petrobras a formar consórcios. O art. 31 da Lei nº 12.351/2010, por sua vez, é genérico e aplicável a todas as empresas, à exceção do parágrafo único, que não permite que a Petrobras ceda direitos relativos à sua participação mínima. Registre-se, ainda, que todos esses dispositivos legais são anteriores à promulgação da Lei nº 13.302/2016.
Dessa forma, o Decreto nº 9.355/2018 exorbita do poder regulamentar e dos limites da delegação legislativa ao criar procedimento especial de cessão de direitos de exploração, desenvolvimento e produção de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos pela Petrobras.
Cabe notar que o Estatuto Jurídico das Empresas Estatais sequer foi mencionado pelo Decreto nº 9.355/2018, na tentativa de evadir a legislação atual que o ato normativo do Poder Executivo evidentemente viola.
Destaque-se, por fim, a flagrante ilegalidade do § 7º do art. 1º do Decreto nº 9.355/2018, transcrito a seguir:
- 7º As contratações de bens e serviços efetuadas pelos consórcios operados pela Petrobras ficarão sujeitas ao regime próprio das empresas privadas, hipótese em que não se aplica o procedimento licitatório, observados os princípios da administração pública previstos na Constituição.
Como já mencionado, o § 5º do art. 1º da Lei nº 13.303/2016 obriga que as contratações da Petrobras, na condição de operadora, ocorram conforme previsto pelo Estatuto Jurídico das Empresas Estatais. Assim sendo, o § 7º do art. 1º do Decreto nº 9.355/2018, ao propor que as contratações da Petrobras como operadora de consórcios fiquem sujeitas ao regime próprio das empresas privadas, é uma afronta a esse Estatuto.
Diante do exposto, solicitamos aos nobres pares o apoio necessário para, nos termos do art. 49, V, da Constituição Federal, sustar o Decreto nº 9.355, de 25 de abril de 2018, que patentemente exorbita do poder regulamentar e dos limites de delegação legislativa.
Sala das Sessões, em de de 2018.
Senador ROBERTO REQUIÃO