Senhoras e senhoras senadores. Falo na condição de Presidente da Representação Brasileira no Parlamento do Mercosul, o Parlasul. No dia de hoje, os argentinos vivem um feriado nacional. Não é propriamente uma celebração, mas uma lembrança, uma triste lembrança dos seus mortos na Guerra das Malvinas. A presidente Cristina Kirchner comandou o ato principal da Nação argentina, na chamada “cidade do fim do mundo”, Usuhaia. Lá inaugurou uma praça e acendeu “a chama eterna”. As Ilhas Malvinas, complexo de ilhas cujas principais são as Malvinas, Georgias e Sandwich do Sul, fica a 760 km de Usuhaia e a 14.000 km de Londres. Para os argentinos é um momento de luto, de renovação do seu sentimento nacional e de reflexão. Para nós, brasileiros, deve ser também um momento de reflexão e de afirmação da nossa identidade sul-americana e latino-americana. E de afirmação nosso repúdio claro e inequívoco ao colonialismo. A questão das Malvinas deve ser vista sob este prisma, o do anacronismo absoluto deste resquício colonialista no solo sul-americano em pleno século XXI. Os argentinos tiveram amargas lições com a Guerra das Malvinas. Setores da sociedade argentina aprenderam que não deveriam mais contar com os militares para resolver conflitos ideológicos, políticos, sociais. Que as ditaduras militares não são remédio e alternativa à luta política franca, aberta. Os argentinos perderam a Guerra das Malvinas e ganharam seu caminho de volta à democracia. Nosso apoio incondicional à soberania argentina sobre as Malvinas não se confunde com a valorização do ato insano da ditadura militar, que usou o legítimo direito como meio oportunista para ganhar sobrevida, atirando à morte certa jovens e inexperientes recrutas, quando não torturando-os para que se jogassem como suicidas na batalha desigual. Nosso ato de solidariedade é, ao mesmo tempo, um ato de repúdio e de denúncia da ditadura. O aprendizado, as lições da guerra são mais amplos ainda. Aprenderam o que o Brasil já sabia desde o século XIX. Aprenderam que os Estados Unidos têm a América do Sul como parte do seu Império. Com o apoio político e militar norte-americano à Grã-Bretanha na Guerra das Malvinas ficou totalmente desmascarada a política norte-americana, a Doutrina Monroe e todas as suas políticas. Como ensina o professor Moniz Bandeira, os argentinos e os sul-americanos aprenderam que o Tratado Interamericano de Assistência Recíproca – TIAR e a Organização dos Estados Americanos – OEA só existiam para defender sua predominância sobre a América Latina. E servir aos seus interesses de grande potência no conflito Leste-Oeste. Neste sentido, os EUA sofreram contundente derrota na Guerra das Malvinas. A doutrina Monroe, sintetizada na expressão “A América para os americanos”, foi desenvolvida pelo presidente norte-americano James Monroe (1817 – 1825). Dela derivaram todas as iniciativas dos EUA em relação ao continente latino-americano: o panamericanismo, as guerras de ocupação, o apoio a ditaduras militares e governos entreguistas, a ALCA, e o Consenso de Washington com a imposição de políticas neoliberais,infelizmente ainda incensadas por desavisados e adesistas em nossos países, inclusive no nosso governo e nesta Casa. Com a “traição” dos EUA, a Argentina aprendeu o que o Brasil sempre soube. Em artigo denominado “O continente enfermo”, publicado em 3 de maio de 1899, Rui Barbosa assim desmonta a doutrina Monroe: “ A doutrina Monroe no uso diplomático dos Estados Unidos, tivera, em todos os tempos, “um caráter exclusivamente norte-americano”, … e que, cerrando, por aquela fórmula memorável, o continente americano à cobiça Européia não fizera mais do que o reservar aos empreendimentos futuros da sua.” Isso o Brasil sempre soube, mas alguns entre nós, no governo, no comando dos partidos ditos de esquerda, no Congresso Nacional precisam aprender. Aprender o que o Brasil sempre soube. Se a Guerra das Malvinas desmoralizou a política norte-americana para a América Latina, por outro lado aproximou argentinos e brasileiros. A posição acertada do Brasil no conflito criou as condições que fosse o dissipado o estúpido sentimento de rivalidade entre os nossos países. O Brasil colaborou com a Argentina não apenas durante a Guerra, mas em seguida a ela. Quando a Comunidade Econômica Européia impôs sanções comerciais à Argentina no pós guerra, ao invés de tirar tolas vantagens comerciais imediatas da situação, colocando os seus produtos nos mercados antes ocupados pelos argentinos, o Brasil agiu estrategicamente, oferecendo facilidades para que as exportações argentinas de produtos agropecuários fosse realizada através dos portos de Santos, Paranaguá e Rio de Janeiro. Com isso, foram criadas as condições de confiança para a futura integração econômica e social entre os nossos países. O Parlasul, cuja Representação Brasileira eu presido, tem sido um espaço privilegiado da manifestação da solidariedade dos brasileiros, paraguaios e uruguaios aos irmãos argentinos na questão das Malvinas. A mais recente declaração do Parlasul sobre o tema é fruto de proposta de minha autoria, na reunião plenária realizada na sede do Parlasul, em Montevidéu, em 02.12.2012. Trata-se de uma recomendação ao Conselho do Mercado Comum, o órgão decisório supremo do Mercosul, integrado pelos Presidentes da República, para a Solução Pacífica para o Problema das Ilhas Malvinas. Através dela, o Parlasul recomenda ao Conselho do Mercado Comum o que segue: “Nas negociações de todos os tratados e acordos entre o MERCOSUL e demais blocos ou países, será levada em conta a questão das Malvinas ocupadas, buscando-se uma solução pacífica para o problema.” Pois bem. Neste 2 de abril, os argentinos estão em vigília pela recuperação das Malvinas. Eu assinei, e vários senadores e deputados já assinaram, uma Declaração, que passo a ler, convidando aos senhores senadores que também firmem, como expressão do nosso fraterno apoio a esta causa que é tão cara aos argentinos e aos sul-americanos: DECLARAÇAO DE APOIO A REPUBLICA ARGENTINA PELAS ILHAS MALVINAS, GEORGIAS E SANDWICH DO SUL As Ilhas Malvinas constituem uma parte integral e indivisível do território argentino. Em 1833 foram ocupadas ilegitimamente pela Grã-Bretanha e sua população foi expulsa. Desde então, a República Argentina denunciou e reclamou ao país ocupante, solicitando iniciar as negociações que permitam encontrar uma solução para a disputa de soberania. O reclamo de soberania argentina sobre as Ilhas Malvinas é uma causa de todos os países da América Latina e da comunidade internacional. Queremos somar-nos a este reclamo, pois é um sentimento comum, que provém de uma história de lutas compartilhadas contra o colonialismo e a favor da liberdade. Nossa história está profundamente castigada pelo sofrimento que durante séculos nossos povos tiveram que enfrentar pela opressão e a dependência de potências estrangeiras. O colonialismo foi causa do saqueamento dos nossos recursos naturais, que condenaram à pobreza a países ricos, injusta e ilegitimamente. Antes foi a borracha, o ouro, a prata, as madeira preciosas. Hoje, as reservas petrolíferas do nosso subsolo continental oceânico e as imensas riquezas pesqueiras de nossos mares. Queremos que esta Declaração se converta num apelo para gerar um âmbito amplo e aberto a todas as correntes e ideias políticas, a partir do qual se poderá conhecer e difundir melhor tudo o que significa o regime colonial e a presença militar britânica nas Ilhas Malvinas e que expresse nossa convicção de que somente por via das negociações se alcançará uma solução pacífica e definitiva. Já não há lugar nem tempo em nosso continente para que esta anacrônica situação continue.” As Malvinas são Argentinas. E o caminho para sua retomada é o da pressão política, da negociação. O caminho da solução pacífica. É o que tinha a dizer.
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