Em 5 de novembro de 2013 apresentei à Mesa do Senado Federal três requerimentos de informações: um ao Ministro de Estado da Fazenda sobre a composição das dívidas tributárias e das multas das Organizações Globo, um segundo, ao Ministro do Desenvolvimento, sobre empréstimos concedidos às Organizações Globo, e um terceiro, ao Ministro da Fazenda, sobre as razões que levaram o Governo a determinar, por decreto, a elevação do percentual de capital estrangeiro no total do capital social do Banco do Brasil.
Estranhamente, só agora, em 6 de fevereiro, a mesa deliberou sobre os três requerimentos. E de forma estranha.
A página do Senado na internet revela, inicialmente, que os três requerimentos haviam sido aprovados.
Naquela página consta o seguinte andamento comum a cada um dos três requerimentos:
Em sua 1ª Reunião, no dia 06.02.2014, a Mesa do Senado deferiu o presente Requerimento, nos termos do Relatório.
Ao Plenário.
Mas, surpreendente e inexplicavelmente, em 13/02/2014, portanto uma semana depois, a página apresentou alteração no andamento dos requerimentos sobre as dívidas da Globo. Eis o novo andamento, radicalmente diferente do anterior:
************* Retificado em 13/02/2014*************
Em sua 1ª Reunião, no dia 06.02.2014, a Mesa do Senado aprovou parecer pelo encaminhamento da Matéria à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, nos termos do Relatório.
Ao Plenário.
Incrível! A matéria dos dois requerimentos teve seu curso alterado e foi encaminhada à CCJ.
As razões do encaminhamento são rigorosamente absurdas: o novo parecer aprovado na Mesa para fundamentar a oitiva da CCJ veio expresso nos seguintes termos:
“É bem verdade que, em geral, as dívidas e multas fiscais de um grupo empresarial constituem matéria protegida pelo sigilo fiscal. No caso do sigilo fiscal, a obrigação de sua preservação encontra-se expressa no Código Tributário Nacional:
Art. 198 Sem prejuízo do disposto na legislação criminal, é vedada a divulgação, para qualquer fim, por parte da Fazenda Pública ou de seus funcionários, de qualquer informação, obtida em razão do ofício, sobre a situação econômica ou financeira, dos sujeitos passivos ou de terceiros e sobre a natureza, e o estado dos seus negócios ou atividades.
O dispositivo acima citado só admite três exceções. Ou seja, só existem três situações em que pode ser quebrado o sigilo fiscal: convênio entre as Secretarias de Fazenda, ordem judicial e CPI.
Daí conclui o parecer, aprovado, com o seguinte voto:
Sendo assim, opinamos, neste momento prévio, pelo encaminhamento do Requerimento nº 1.279, de 2013, à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, para que nos termos dispostos na Seção II do Ato da Mesa nº 1, de 2001, se pronuncie quanto à constitucionalidade, juridicidade, mérito e pertinência dos fundamentos da solicitação.
O incrível novo andamento dado aos requerimentos é rigorosamente absurdo e é evidente o seu propósito meramente procrastinatório, uma vez que o próprio relator não tinha nenhuma dúvida de que, de fato, eu não havia requerido qualquer informação sigilosa.
Vejam os dois seguintes textos do parecer ofertado ao Requerimento 1279:
No presente requerimento, como se trata de um pedido de informações sobre dívidas e multas fiscais de um grupo empresarial, as informações solicitadas não demarcam nem caracterizam operações ativas e passivas de instituições financeiras. Não constituem, portanto, informação de natureza sigilosa.
(…)
Todavia, o requerimento é explícito em limitar-se a matéria não sigilosa, e, em seus exatos termos sobre isso é que deve ser acatado.
E, de fato, os requerimentos são mesmo explícitos quanto à não se pedir matéria sigilosa, como se extrai do texto dos próprios requerimentos, a exemplo do primeiro deles:
Saliento que somente estão excluídos do pedido acima as informações e os documentos que, em conformidade com os estritos preceitos legais, estão acobertados pelo sigilo fiscal, casos em que devem ser encaminhados os dados cadastrais dos respectivos processos com as razões legais para a manutenção de seu sigilo.
Esse mesmo texto está presente nos dois requerimentos sobre a Globo.
Há uma incoerência intrínseca no parecer aprovado pela Mesa do Senado (se é que esse foi realmente o parecer aprovado), pois enviou à CCJ para examinar a constitucionalidade do pedido, sob a alegação de que a matéria adentraria em sigilo fiscal, ao passo que os próprios requerimentos e o próprio parecer deixam patentes que não se trata de adentrar em matéria sigilosa.
A leitura que qualquer jejuno faz do fato é que a mesa se acovardou, se curvou diante da Globo. Mudou sua decisão, para procrastinar a decisão. Terá sido uma generosidade voluntária ou terá a Globo pedido ou ordenado que assim a Mesa procedesse. Terá a Globo determinado que Mesa alterasse a sua decisão anterior, que havia sido publicada na página do Senado na internet?
No seu discurso de posse na presidência do Senado, o senador Renan Calheiros surpreendeu negativamente a mim e à Nação, ao dizer que interditaria o debate sobre a democratização da mídia. Disse claramente que imporia: “um antídoto contra as pretensões que ocorrem em alguns países.” E disse ainda: “Temos que nos inspirar sim, nas brisas de uma primavera democrática e criar uma barreira contra os calafrios provocados pelo inverno andino. Vamos criar uma trincheira sólida, se preciso legal, a fim de impedir, de barrar a passagem destes ares gélidos e soturnos”
Então, é isso? Então, é assim? Os meus requerimentos de informação chocaram-se contra uma Mesa que, ao invés de cumprir o seu dever institucional de fazer andar o processo legislativo, submete-se ao papel humilhante e inconstitucional de trincheira da Rede Globo contra as prerrogativas parlamentares de um Senador da República?
São escolhas! E todos somos o resultado das nossas escolhas! As nossas biografias são, enfim, a narrativa das escolhas que fizemos e fazemos!
Eu escolho não fazer genuflexão diante de Mamon, nem da Rede Globo! Eu escolho recorrer ao Plenário contra a decisão da Mesa, já que nas duas decisões tomadas, a matéria foi destinada “Ao plenário”.
Veremos se ainda há Senadores da República no Brasil!
A propósito, quero registrar que, precavendo-me da procrastinação que a decisão poderia ter na Mesa e nesta Casa sobre meus requerimentos, protocolei ofícios pessoais, como cidadão, com fundamento na Lei da Transparência junto ao Ministério da Fazenda e do Desenvolvimento sobre as mesmas matérias.
Pasmem. Senhores Senadores: as respostas, que chegaram a mim no dia 27, são as mais estapafúrdias e furadas:
Quanto ao requerimento sobre as dívidas tributárias da Globo, o Ministério da Fazenda, a resposta foi de que “tais informações estão protegidas pelo sigilo fiscal nos termos do art. 198 do Código Tributário Nacional.”
Não é possível admitir-se que falte inteligência a quem deu a resposta, para não entender que eu havia literalmente pedido as informações que não estão protegidas pelo sigilo.
E elas existem? Sim. A Constituição Federal diz que o processo judicial é público. Movida, portanto, uma execução fiscal contra quem quer que seja, essa informação passa a ser pública.
É o caso, por exemplo, da ação 0502494-59.2007.4.02.5101 (número antigo: 2007.51.01.502494-9), em que é promovida uma execução fiscal contra TV GLOBO LTDA, em tramitação na 8ª Vara Federal de Execução Fiscal do Rio de Janeiro, e que desde 21/09/2012 está esperando um despacho do juiz JULIO EMILIO ABRANCHES MANSUR.
Um ano e meio para dar um despacho em uma ação de execução fiscal, mais um absurdo.
Certo é que existem informações que não estão protegidas pelo sigilo fiscal e o Ministro da Fazenda simplesmente nega fornecê-las.
Essa é a transparência do Governo Dilma Rousseff.
Se se nega a um Senador da República uma informação como a que eu requeri, o que dizer da hipótese de um cidadão que não detenha cargo político tentar conseguir uma informação dessa natureza …
O segundo requerimento, que tratava de empréstimos concedido à Globo, foi respondido pelo Ministério do Desenvolvimento de forma lacônica e irresponsável:
Ou seja, o Ministério ao qual está vinculado o BNDES simplesmente diz, em outras palavras “se quiser, peça as informações ao BNDES, eu, Ministro, é que não vou pedir”.
Essa é a transparência desse Governo.
O terceiro requerimento não teve melhor sorte – nele eu pedi as razões da elevação da participação de estrangeiros no capital do Banco do Brasil.
O Ministro da Fazenda simplesmente respondeu transferindo ao Banco Central a responsabilidade.
Confira-se a resposta:
Daí, posso ter a certeza de que vem mais uma dessa preciosidades, dessas pérolas de resposta sobre não transparência.
Onde está o respeito ao direito do cidadão à informação?
O povo tem o direito de saber como está sendo administrado seu dinheiro e cobrado de quem deve, seja o devedor um senador da república, seja a poderosa Rede Globo.
O povo tem direito de saber a quem estão sendo emprestados os recursos públicos a preços subsidiados.
Temos que dar um basta nessa farsa de conversa mole de transparência ou fazê-la verdadeira. E dizer às autoridades que cumprem o papel indigno de muralha da Rede Globo que o povo não é bobo.