“Para Brasil, para com força, para de verdade”, conclamou o senador Roberto Requião, no plenário, ao apoiar a greve geral convocada para esta sexta-feira (27). Requião fez um a análise da reforma da Previdência pretendida pelo governo geral, classificando-a de “infame”, por sacrificar apenas os trabalhadores e mais pobres, e propôs saídas para a crise.
Veja o vídeo e o texto do discurso.
PREVIDÊNCIA E RETOMADA DA ECONOMIA
É de se perguntar, diante de tanta rejeição, por que o Governo Temer confronta a totalidade da opinião pública brasileira ao insistir em uma reforma previdenciária absolutamente impopular e sem qualquer evidência de eficácia financeira para socorrer os combalidos cofres públicos.
A resposta fica cada dia mais óbvia: a reforma previdenciária pretende tão simplesmente abrir espaço para a previdência privada, com a degradação e o esfacelamento da Previdência Pública. Por isso, o governo Temer e sua base no Congresso arrostam todo esse desgaste.
O argumento central para a reforma refere-se à situação financeira da Seguridade Social. O Governo Temer sustenta que a Seguridade está quebrada ou que vai quebrar em futuro próximo.
Parlamentares da Câmara e do Senado que não estão muito familiarizados com discussões pormenorizadas a respeito das finanças públicas, e não obstante acompanham os debates com boa fé, compram a ideia da quebra da Previdência como algo inevitável, caso não haja reforma.
Bem, examinemos essa situação por um ângulo mais abrangente, e sem paixão.
Só a verdade, apenas a verdade.
O equilíbrio previdenciário depende de receita e despesa. Se houver aumento exagerado da despesa ou queda exagerada da receita haverá déficit.
Há dois caminhos para reverter esse déficit. Pelo aumento da receita, ou pela redução da despesa. O Governo Temer está optando pelo corte da despesa. uma alternativa suicida: ao reduzir a despesa o Governo está fazendo o oposto de uma política keynesiana, voltada para o estímulo à demanda mediante aumento de gastos públicos.
O equilíbrio dinâmico da Previdência, ou da Seguridade Social em sentido amplo, depende fundamentalmente da ampliação dos gastos públicos de uma maneira geral.
Isso porque o gasto público financiado por déficit público, ao incrementar a demanda agregada, estimula o investimento.
E o investimento estimula o emprego, e o aumento do emprego retroalimenta a demanda, o investimento e o emprego e, finalmente, a receita tributária. Com isso, o déficit público desaparece, e com ele o déficit previdenciário.
Muita gente de boa fé tem medo dos efeitos do déficit público como financiador da retomada do investimento.
Fala-se que a dívida pública perderá credibilidade ou que haverá inflação.
Isso é um equívoco. Só se propõe déficit quando a economia está em recessão ou em contração, como hoje.
Não pode haver inflação quando a demanda está deprimida.
É justamente o que acontece agora com a economia brasileira: a inflação vem caindo por força de dois anos seguidos de contração, que provavelmente se estenderá por este ano.
Adotar austeridade para uma economia em contração é um recurso ideológico infame.
Por que a austeridade recai principalmente sobre os pobres, na forma de redução de salários, de renda e de serviços públicos. Muitos países europeus estão passando por esse processo, com consequências desastrosas. Entretanto, Portugal, escapando da regra, mandou a austeridade às favas e implementou uma política keynesiana com grande sucesso.
Quer dizer, enquanto a ortodoxa Grécia afunda-se sob as ordens da Alemanha, em Portugal o PIB cresce há três anos, assim como o emprego.
Nos tempos áureos da social-democracia europeia, chamados de Era de Ouro do Capitalismo, o paradigma básico da política econômica era o keynesianismo.
Em épocas de crise, gastos previdenciários eram vistos como solução, não um problema. Dava-se aos gastos sociais o nome de “estabilizadores automáticos”, ou seja, mecanismos para a retomada da economia mediante gastos públicos.
Foi a prevalência nos últimos 30 anos da ideologia neoliberal, no contexto da globalização financeira, que destruiu essas políticas.
As consequências, como todos sabem, têm sido dramáticas em termos de estagnação econômica e alta do desemprego. Na Espanha, por exemplo, o desemprego atinge um quarto da população.
É para essa tragédia que estamos sendo arrastados pelo Governo Temer. Ele quer cortar gastos públicos quando são necessários maiores gastos públicos, mesmo que inicialmente deficitários. Sim, porque, havendo crescimento puxado pela demanda pública, logo a receita tributária aumentará, reduzindo ou eliminando o déficit.
Ressalte-se, contudo, que não se trata de qualquer déficit. Déficits orçamentários direcionados para os pagamentos exorbitantes dos juros da dívida pública – cerca de R$ 550 bilhões neste ano – são consumidos pela voragem financeira e enterrados na própria dívida sem qualquer efeito na demanda global.
Na verdade, esses déficits do Governo Temer são estéreis do ponto de vista do crescimento econômico: não financiam nada pelo lado do investimento e nada compram, exceto mais juros, do lado da demanda.
Senhoras e Senhores Senadores,
Senador Cristovam, dirijo-me a Vossa Excelência que tem questionado as críticas à política em curso por aparentemente não apresentarem soluções: a alternativa está aí, às nossas vistas, sem necessidade de impor maiores sacrifícios ao povo e de desestruturar a Previdência Social.
Basta seguir o caminho do New Deal para reverter a Grande Depressão dos anos 30; ou o caminho do Novo Plano alemão, de Hjalmar Schacht, na Alemanha, na mesma época: melhores salários, mais gastos em infraestrutura, investimentos deficitários.
O resto é o fracasso de sempre. Menos para o sistema financeiro, é claro