Na reunião da Comissão de Assuntos Econômicos desta terça-feira (3), o senador Roberto Requião relembrou a manobra da mesa do Senado que fez aprovar acordo entre o Brasil e os Estados, cedendo a soberania nacional sobre o espaço aéreo aos norte-americanos.
Veja a intervenção de Requião e conheça o mandado de segurança que ele impetrou no STF para anular a votação do acordo.
EXCELENTÍSSIMA SENHORA PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Ministros da República, da Justiça, da Guerra, do Estado, do Mar, da Terra: vedes as obrigações que se descarregam sobre vosso cuidado, vedes o peso que carrega sobre vossas consciências, vedes as desatenções do governo, vedes as injustiças, vedes os roubos, vedes os descaminhos, vedes os enredos, vedes as dilações, vedes os subornos, vedes as potências dos grandes e as vexações dos pequenos, vedes as lágrimas dos pobres, os clamores e gemidos de todos? Ou o vedes ou o não vedes. Se o vedes, como o não remediais? E se o não remediais, como o vedes? Estais cegos.
Padre António Vieira, in “Sermões”
ROBERTO REQUIÃO DE MELLO E SILVA, brasileiro, casado, advogado, jornalista e Senador da República (PMDB/PR), portador da Cédula de Identidade Civil RG nº 258.890-0 SSP/PR, inscrito no CPF/MF nº 056.608.909-20, com endereço funcional na Esplanada dos Ministérios, Praça dos Três Poderes, Senado Federal, Anexo II, Bloco A, Ala Teotônio Vilela, Gabinete 18, CEP 70.165-900, Brasília, DF;
PAULO RENATO PAIM, brasileiro, casado, Senador da República (PT/RS), portador de cédula de identidade RG nº 2587611, inscrito no CPF nº 110.629.750-49, com endereço funcional na Esplanada dos Ministérios, Praça dos Três Poderes, Senado Federal, Anexo I, 22º Andar, CEP 70.165-900, Brasília/DF;
LUIZ LINDBERGH FARIAS FILHO, brasileiro, casado, Senador da República (PT/RJ), portador de cédula de identidade RG 13.449.272-7 – IFP/RJ, inscrito no CPF sob o nº 690.493.514-68, com endereço funcional na Esplanada dos Ministérios, Praça dos Três Poderes, Senado Federal, Anexo 11, Bloco A Ala Teotônio Vilela, Gabinete 11, CEP 70.165-900, Brasília, DF;
VANESSA GRAZZIOTIN, brasileira, casada, Senadora da República (PC do B/AM), portadora de cédula de identidade RG nº 8/R472659 SEG/SC, inscrita no CPF nº 161.146.202.91, com endereço funcional na Esplanada dos Ministérios, Praça dos Três Poderes, Senado Federal, Anexo II, Bloco A Subsolo, Ala Alexandre Costa, Gabinete 03, CEP 70.165-900, Brasília, DF, vêm, por seus advogados que subscrevem esta peça, com fundamento no disposto no inciso LXIX, do art. 5º, alíneas “d” do inciso I, do art. 102, ambos da Constituição Federal e no que estabelece a Lei nº 12.016, de 7 de agosto de 2009, impetrar o presente
MANDADO DE SEGURANÇA
contra ato ilegal e abusivo cometido por
EUNÍCIO OLIVEIRA, Senador da República, Presidente do Senado Federal, com endereço funcional no Palácio do Congresso Nacional, Praça dos Três Poderes, CEP 70.165-900
JOÃO ALBERTO SOUZA, brasileiro, Senador da República, com endereço funcional no Palácio do Congresso Nacional, Anexo I, 5º Pavimento, Praça dos Três Poderes, CEP 70.165-900, pelas razões de fato e de direito que passa a expor:
OBJETO
O presente mandado de segurança visa defender o direito subjetivo dos impetrantes ao devido processo legislativo do Projeto de Decreto Legislativo n. 5, de 2018, que aprova o texto do Acordo sobre Transportes Aéreos entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo dos Estados Unidos da América, assinado em Brasília, em 19 de março de 2011.
Os dispositivos constitucionais violados referem-se à competência das comissões permanentes do Senado Federal (art. 58 da CR), em especial da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, bem assim do quórum de deliberação no Senado (art. 47 da CR).
Matéria Constitucional. Questão Jurídica.
Ausência de matéria interna corporis.
No decorrer das razões de mérito será fácil perceber que o objeto da impetração nada tem de matéria interna corporis. E não o é por um motivo: não se invocará nenhum dispositivo regimental para a defesa do direito subjetivo dos Impetrantes e, qualquer menção feita nestes autos a disposições regimentais dar-se-á com o único intuito de exemplificar de que forma o direito subjetivo constitucional, que ora se defende, veio a ser albergado pelo Regimento Interno do Senado Federal.
Todavia, para não serem acusados de não terem se preocupado em defender adequadamente seu direito, os impetrantes pedem licença para invocar as palavras do mestre Pedro Lessa sobre os limites de atuação do Poder Judiciário no controle dos chamados atos políticos, conceito do qual se extrai a atual jurisprudência sobre a matéria interna corporis. Dizia Pedro Lessa:
Para se furtar á competencia do poder judiciario, não basta que uma questão offereça aspectos politicos, ou seja susceptivel de effeitos politicos. É necessario que seja simplesmente, puramente, meramente politica.
Quaes são as questões exclusivamente politicas? As que se resolvem com faculdades meramente politicas, por meio de poderes exclusivamente politicos, isto é, que não têm como termos correlativos direitos incarnados nas pessôas, singulares ou collectivas, sobre que taes poderes se exercem. Quando á funcção de um poder, executivo ou legislativo, não corresponde, ou, antes, não se oppõe um direito, de uma pessoa, physica ou moral, que a acção desse poder interessa, um tal poder pressuppõe evidentemente o arbitrio da autoridade, em quem reside. É um poder discricionario, que portanto não póde ser restringido pela interferencia de outro. Poder meramente politico é um poder discricionário.(…)
E um pouco adiante ensina o professor:
“Acabemos, pois, de uma vez com o equivoco, definindo a verdadeira doutrina americana, que é a nossa. Uma questão póde ser distinctamente politica, altamente politica, segundo alguns, até puramente politica, fora dos dominios da justiça, e comtudo, em revestindo a fórma de um pleito, estar na competencia dos tribunaes, desde que o acto, executivo ou legislativo, contra o qual se demande, fira a Constituição, lesando ou negando um direito nella consagrado. (…). Analogamente, discorrendo também dos Insular Cases, dizia, ha pouco, outra autoridade, o professor Rowe: “Estes julgados serviram de realçar com grande clareza a posição única occupada pela Côrte Suprema. Diversamente de outro qualquer tribunal, lhe cabe ás vezes resolver questões, que, suposto juridicas na fórma, são politicas na substancia, e actuam profundamente sobre a estructura de nossas instituições”. (…) Dest’arte a interpretação constitucional se afastou da politica tanto quanto possivel. Este “tanto quanto possivel”, rematando e restringindo as considerações anteriores, bem está mostrando não se poderem evitar de todo as questões políticas, antes serem muitas vezes de necessidade absoluta, na competencia de um tribunal creado para constituir o juiz unico e definitivo, assim dos seus proprios direitos, como dos do poder legislativo e do executivo. Por mais que se apurem sutilizas, requintando ficções e convenções, nunca se poderá conceber que não tope frequentemente em questões politicas de alta gravidade o definidor exclusivo e supremo dos limites entre os tres orgams da soberania nacional na distribuição constitucional dos poderes”.
E algumas linhas depois:
“Numa palavra: a violação de garantias constitucionaes, perpetrada á sobra de funcções politicas, não é imune á acção dos tribunaes. A estes compete sempre verificar se a attribuição politica, invocada pelo excepcionante, abrange nos seus limites a faculdade exercida”.
Em substancia: exercendo attribuições politicas, e tomando resoluções politicas, movese o poder legislativo num vasto dominio, que tem como limites um circulo de extenso diametro, que é a Constituição Federal. Emquanto não transpõe essa peripheria, o Congresso elabora medidas e normas, que escapam á competencia do poder judiciario. Desde que ultrapassa a circumferencia, os seus actos estão sujeitos ao julgamento do poder judiciario, que, declarando-os inapplicaveis por offensivos a direitos, lhes tira toda a efficacia juridica. (Do Poder Judiciario. Livraria Francisco Alves: Rio de Janeiro, 1915, p. 59 e 6366 – redação conforme o original – grifos nossos)
Assim, não é o ser ou o não ser uma matéria “política” o que atrairá ou afastará a competência do Supremo, mas sim o seu dever precípuo de guardar a Constituição. É, a princípio, a Constituição. Ao final e ao cabo, é a Constituição. Sempre a Constituição o guia supremo da Corte Suprema.
A legitimidade ativa dos parlamentares impetrantes
O Supremo Tribunal Federal tem reconhecido amplamente a legitimidade ativa de parlamentar para a propositura de mandado de segurança assegurando a defesa de direito subjetivo ao devido processo legislativo, do que é exemplo a egrégia Corte, o acórdão no Mandado de Segurança nº 24.667, Relator o Ministro Carlos Velloso, julgado em 04/12/2003:
CONSTITUCIONAL. PODER LEGISLATIVO: ATOS: CONTROLE JUDICIAL. MANDADO DESEGURANÇA. PARLAMENTARES.
- – O Supremo Tribunal Federal admite a legitimidade do parlamentar – e somente do parlamentar – para impetrar mandado de segurança com a finalidade de coibir atos praticados no processo de aprovação de lei ou emenda constitucional incompatíveis com disposições constitucionais que disciplinam o processo legislativo.
- – Precedentes do STF: MS 20.257/DF, Ministro Moreira Alves (leading case) (RTJ 99/1031); MS 20.452/DF, Ministro Aldir Passarinho (RTJ 116/47); MS 21.642/DF, Ministro Celso de Mello (RDA 191/200); MS 24.645/DF, Ministro Celso de Mello, “D.J.” de 15.9.2003; MS 24.593/DF, Ministro Maurício Corrêa, “D.J.” de 08.8.2003; MS 24.576/DF, Ministra Ellen Gracie, “D.J.” de 12.9.2003; MS 24.356/DF, Ministro Carlos Velloso, “D.J.” de 12.9.2003.
III. – Agravo não provido. Acórdão publicado no DJE de 23/04/2004)
Com efeito, o Supremo Tribunal Federal vem acumulando decisões no sentido de afastar o argumento da prevalência dos atos internos das Casas Legislativas para reconhecer o direito subjetivo dos parlamentares ao devido processo legislativo. O precedente condutor foi firmado pelo Plenário, no Mandado de Segurança nº 23.831/DF, publicado no DJ 04/08/06, em que foi relator o Exmo. Ministro Celso de Mello:
(…)
O CONTROLE JURISDICIONAL DOS ATOS PARLAMENTARES: POSSIBILIDADE, DESDE QUE HAJA ALEGAÇÃO DE DESRESPEITO A DIREITOS E/OU GARANTIAS DE ÍNDOLE CONSTITUCIONAL. – O Poder Judiciário, quando intervém para assegurar as franquias constitucionais e para garantir a integridade e a supremacia da Constituição, desempenha, de maneira plenamente legítima, as atribuições que lhe conferiu a própria Carta da República, ainda que essa atuação institucional se projete na esfera orgânica do Poder Legislativo. – Não obstante o caráter político dos atos parlamentares, revela-se legítima a intervenção jurisdicional, sempre que os corpos legislativos ultrapassem os limites delineados pela Constituição ou exerçam as suas atribuições institucionais com ofensa adireitos públicos subjetivos impregnados de qualificação constitucional e titularizados, ou não, por membros do Congresso Nacional. Questões políticas. Doutrina. Precedentes. – A ocorrência de desvios jurídico-constitucionais nos quais incida uma Comissão Parlamentar de Inquérito justifica, plenamente, o exercício, pelo Judiciário, da atividade de controle jurisdicional sobre eventuais abusos legislativos (RTJ 173/805-810, 806), sem que isso caracterize situação de ilegítima interferência na esfera orgânica de outro Poder da República. (grifamos)
Albergando uma posição mais aberta ao controle jurisdicional do processo legislativo, o Ministro Sepúlveda Pertence sustentou que a jurisprudência acerca da impossibilidade de o Supremo Tribunal Federal examinar matéria interna corporis não seria aplicável quando em jogo a defesa de direito subjetivo.
Esse ponto de vista do Ministro Sepúlveda Pertence, embora vencido em alguns julgados, serviu para que este Supremo Tribunal Federal evoluísse a jurisprudência para admitir o cabimento do mandado de segurança em diversas outras hipóteses, dentre as quais é exemplo marcante a disciplina dos poderes das CPIs e do poder dos presidentes das Casas Legislativas para designar, ou não, membros de comissões.
Veja-se, por exemplo, o voto proferido pelo Ministro Sepúlveda Pertence no julgamento do MS 21.754, Redator para o acórdão o Ministro Francisco Rezek, Plenário, DJ 21.2.1997:
Senhor Presidente, entendo que esta jurisprudência é correta, e decorre menos de textos expressos do que de uma experiência internacional de concretização do princípio da independência e da harmonia dos Poderes. A ela não tenho dúvida em me alinhar. Permito-me uma breve consideração, apenas para não me comprometer com a linha dessa jurisprudência, quando ela, a meu ver, extravasa ou supera um pouco os limites da sua legitimidade.
Como um critério pragmático, prático, empírico, se repete muito, no tema, é que, no processo legislativo ou em qualquer deliberação da Câmara, o que o Judiciário pode apurar são as violações de norma constitucional, não de norma regimental. Minha ótica, no ponto, é um pouco diversa. Não me sinto, neste momento, autorizado à afirmação apodítica de que da violação da norma regimental não possa surgir jamais uma questão susceptível de solução jurisdicional. O que me parece essencial é saber, seja qual for a norma jurídica invocada, se há, em tese, direito subjetivo a proteger. Se existe, pode a norma de referência ser regimental. Assim como, pode a violação de norma constitucional não trazer viabilidade, ao mandado de segurança, se não há direito subjetivo em jogo: aí, a ofensa à Constituição poderá gerar, sim, a inconstitucionalidade formal da norma dela decorrente a ser declarada, porém, em outras vias. (grifamos)
É a existência de direito subjetivo dos impetrantes o ponto central do presente mandado de segurança. As linhas a seguir deixarão bem clara a caracterização do direito subjetivo dos impetrantes ao devido processo legislativo de deliberação (discussão e votação) do Projeto de Lei nº 79, de 2016, cujo direito cujo exercício é obstado pelo ato coator da autoridade impetrada.
Mais recentemente, os impetrantes, juntamente com outros senadores, obtiveram do Supremo Tribunal Federal proteção do seu direito subjetivo ao devido processo legislativo. Com efeito, no MS 34.562 MC / DF, impetrado para assegurar a regular tramitação do PLC 79/2016, que alterava a Lei Geral das Telecomunicações, o Supremo assim decidiu, em liminar, posteriormente confirmada:
Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. PROJETO DE LEI APROVADO EM COMISSÃO DO SENADO FEDERAL. RECURSO PARA SUBMISSÃO DA MATÉRIA AO PLENÁRIO DA CASA (CF, ART. 58, § 2º, I). DEVIDO PROCESSO LEGISLATIVO.
- O Supremo Tribunal Federal somente deve interferir em procedimentos legislativos para assegurar o cumprimento da Constituição, proteger direitos fundamentais e resguardar os pressupostos de funcionamento da democracia e das instituições republicanas.
- Impossibilidade de remessa de projeto de lei à sanção presidencial antes de exame fundamentado sobre recursos interpostos para submeter a matéria ao Plenário do Senado Federal (CF, art. 58, § 2º, I)
- Liminar deferida parcialmente. (grifamos)
Os fatos
Como se vê pela ficha de tramitação do Decreto Legislativo nº 5, de 2018, a matéria sofreu a seguinte tramitação:
- Foi apresentada (vinda da Câmara dos Deputados), em 20/12/2017;
- Foi encaminhadas à Comissão de Relações Exteriores em 23/02/2018, com o seguinte despacho: “À CRE, onde poderá receber emendas pelo prazo de cinco dias úteis, tendo a referida comissão o prazo de quinze dias úteis para opinar sobre a matéria, prorrogável por igual período, nos termos do art. 376, III, RISF”;
- Em 27/02/2018 foi encaminhada à Secretaria Geral da Mesa, “a pedido” e nessa mesma data foi incluída na pauta de votação (ordem do dia) da sessão de 28/02/2018, ou seja, do dia seguinte, em razão da aprovação, ainda em 27/02/2018, do Requerimento de Urgência nº 54/2018;
- Em 01/03/2018 foi anunciada a matéria, e “proferido pelo Senador Antônio Anastasia o Parecer nº 21, de 2018-PLEN-SF, de Plenário, em substituição à CRE, que conclui pela aprovação do projeto”;
- Nessa mesma oportunidade, “A Presidência suspende a apreciação da matéria” uma vez que as normas regimentais não permitem a apreciação de imediato”;
- Em 05/03/2018, a matéria foi incluída na pauta de 06/03/2018, todavia não houve sessão, tendo sido inserida na ordem do dia de 07/03/2018;
- Em 07/03/2018, foi decretado o encerramento da discussão nos seguintes termos: “Discussão encerrada. Aprovado o projeto, com os votos contrários dos Senadores Lindbergh Farias e Roberto Requião. À promulgação”.
A matéria foi, portanto, votada em regime de urgência, instituto que advém da Constituição Federal, cujo art. 64, § 1º prevê que “§ 1º – O Presidente da República poderá solicitar urgência para apreciação de projetos de sua iniciativa.”
No âmbito regimental, a iniciativa de propor a urgência foi estendida aos parlamentares, nos termos dos arts. 336 a 353.
Consoante o entendimento constitucional e regimental, a urgência não significa nada além da transferência ao Plenário do Senado, do poder de apreciação e de discussão de uma matéria.
Com efeito, o art. 58 da Constituição reza:
Art. 58. O Congresso Nacional e suas Casas terão comissões permanentes e temporárias, constituídas na forma e com as atribuições previstas no respectivo regimento ou no ato de que resultar sua criação.
No caso, consoante os arts. 72 e 103[1] do Regimento Interno do Senado, compete à Comissão de Relações Exteriores apreciar e emitir parecer sobre matérias afetas aos tratados internacionais e à segurança nacional.
Conforme já reportado, foi aprovado o Requerimento nº 54/2018 (anexo) para que o PDS nº 5/2018 fosse apreciado na forma do inciso II do art. 336, in verbis:
Art. 336. A urgência poderá ser requerida:
II – quando se pretenda a apreciação da matéria na segunda sessão deliberativa ordinária subsequente à aprovação do requerimento;
Como se passa a demonstrar, a tramitação que se sucedeu à aprovação do requerimento de urgência 54/2018 descumpriu frontalmente dois dispositivos constitucionais, o dever de apreciação das proposições legislativas (art. 58 e outros da CR) e o quórum de deliberação (art. 47 da CR):
Vejamos.
- dever de apreciação das proposições legislativas:
No processo legislativo previsto na Constituição Federal, as votações deverão sempre ser antecedidas de discussão.
São exemplos desse corolário, os art. 64 e 65 da Carta Magna:
Art. 64. A discussão e votação dos projetos de lei de iniciativa do Presidente da República, do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais Superiores terão início na Câmara dos Deputados.
Art. 65. O projeto de lei aprovado por uma Casa será revisto pela outra, em um só turno de discussão e votação, e enviado à sanção ou promulgação, se a Casa revisora o aprovar, ou arquivado, se o rejeitar.
A Constituição oferta, ainda, a possibilidade de que as comissões, no caso de projeto de lei (o que não é o caso), discutam e votem matéria, sem a posterior apreciação pelo Plenário, conforme prevê o § 2º do art. 58, verbis:
- 2º Às comissões, em razão da matéria de sua competência, cabe:
I – discutir e votar projeto de lei que dispensar, na forma do regimento, a competência do Plenário, salvo se houver recurso de um décimo dos membros da Casa;
A discussão, é, portanto, da essência do Parlamento.
No caso em apreço, não houve discussão.
A sucessão de fatos que ocorrerem na sessão de 07/03/2018 deixa patente o cerceamento do direito à discussão: o senador Requião pediu para discutir a matéria e foi-lhe negado.
- o quórum de deliberação:
Da mesma forma, o comando constitucional relativo ao quórum de deliberação (art. 47 da CR) não foi observado na tramitação da referida proposição legislativa.
O art. 47 da Constituição Federal de termina que:
Art. 47. Salvo disposição constitucional em contrário, as deliberações de cada Casa e de suas Comissões serão tomadas por maioria dos votos, presente a maioria absoluta de seus membros.
O art. 288 do Regimento Interno replica o art. 47 da Constituição Federal:
Art. 288. As deliberações do Senado serão tomadas por maioria de votos, presente a maioria absoluta dos seus membros (Const., art. 47). As hipóteses de exigência de quórum diverso estão listadas nos incisos do referido artigo, nenhum das quais aplicáveis ao caso presente.[2]:
[…]
O art. 337 do Regimento Interno não permite que a urgência dispense o quórum estabelecido no art. 47 da Constituição Federal in verbis:
Art. 337. A urgência dispensa, durante toda a tramitação da matéria, interstícios, prazos e formalidades regimentais, salvo pareceres, quórum para deliberação e distribuição de cópias da proposição principal.
Como se percebe, os limites colocados no Regimento Interno à tramitação em regime de urgência da ratificação de tratados internacionais visam assegurar no processo legislativo a prevalência de dois valores constitucionais: o princípio da legalidade e o princípio democrático. A regra é o debate, a discussão, os prazos, os interstícios. A exceção é a sua supressão, somente admissível em situações de urgência.
Mas, esse é o espirito da concreção regimental da regra constitucional: não há urgência que possa afastar a exigência de quórum para deliberação.
Em 07/03/2018, foi igualmente violado o direito da população de ver seus representantes votando. Não havia mais que oito senadores em Plenário.
Seguindo as exigências regimentais, o primeiro impetrante requereu a verificação de quórum, apoiado pelos demais impetrantes, e isso lhes foi negado sumariamente, em plena afronta ao ditame do art. 47 da Constituição Federal.
Aqui fica claro que a presente impetração nada tem de matéria interna corporis. Salta aos olhos que são de natureza constitucional os dois fundamentos do pedido: dever de apreciação das proposições legislativas (art. 58 e outros da CR).
Realmente, quando aberta a sessão e chamado o primeiro item da pauta (na verdade, foi chamado o sétimo item, em flagrante violação do Regimento Interno e do princípios constitucionais da publicidade e democrático que será tratada adiante), havia sete senadores em plenário: o impetrado senador João Alberto, o senador Benedito de Lira e os senadores Roberto Requião, Vanessa Grazziotin, Lindbergh Farias e Paulo Paim.
Portanto, não havia quórum de deliberação, que, à luz do art. 47 da Constituição Federal e do art. 288 do Regimento Interno, é de maioria simples, presente a maioria absoluta dos membros do Senado.
Mesmo ausente o quórum de deliberação, o presidente da sessão, o impetrado senador João Alberto aprovou a matéria, sob os protestos dos demais cinco senadores. O senador Roberto Requião pediu verificação de quórum, tendo contado com o apoiamento de quatro senadores, um a mais do que o número exigido. Ainda assim, em flagrante violação ao texto do art. 47 da CR, o impetrado senador João Alberto ignorou o pedido de verificação e deu por aprovada a matéria.
As notas taquigráficas e as imagens em vídeo, anexadas, provam o atentado à Constituição Federal na lamentável sessão do dia 7 de março.
As notas taquigráficas:
O SR. PRESIDENTE (João Alberto Souza. PMDB – MA) – Como não há mais oradores para discutir a matéria, encerrada a discussão.
Em votação.
As Srªs e os Srs. Senadores que aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovado, contra o voto do Senador Lindbergh e abstenção do Senador Roberto Requião.
A matéria vai à promulgação.
O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB – PR) – Presidente, eu não me abstive, eu votei contra e quero ver se nós conseguimos apoiamento para pedir verificação de quórum, verificação de votação. Verificação.
O SR. PRESIDENTE (João Alberto Souza. PMDB – MA) – Não teve apoiamento.
O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB – PR) – Estão aqui: Vanessa Grazziotin, Lindbergh e Requião. Verificação de votação.
O SR. PRESIDENTE (João Alberto Souza. PMDB – MA) – Não tivemos o apoiamento.
O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB – PR) – Temos apoiamento, sim.
O SR. PRESIDENTE (João Alberto Souza. PMDB – MA) – Precisaria de V. Exª e mais três, e nós não tivemos.
O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB – PR) – Senador Paim, Vanessa.
O SR. PRESIDENTE (João Alberto Souza. PMDB – MA) – Item nº 9.
Aprovado o projeto.
Item nº 9.
O SR. BENEDITO DE LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP – AL) – Há, sim.
O SR. PRESIDENTE (João Alberto Souza. PMDB – MA) – Projeto de Lei do Senado nº 366, de 2015…
O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB – PR) – Presidente, nós pedimos verificação de votação.
O SR. PRESIDENTE (João Alberto Souza. PMDB – MA) – … do Senador Roberto Rocha…
O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB – PR) – É inaceitável, Sr. Presidente…
O SR. PRESIDENTE (João Alberto Souza. PMDB – MA) – … que altera o Código de Processo Penal para estabelecer o direito de acesso pelo advogado…
O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB – PR. Fora do microfone.) – … não garantir o direito de o Parlamentar falar. Verificação de votação!
O SR. PRESIDENTE (João Alberto Souza. PMDB – MA) – … do investigado às provas do inquérito policial…
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PCdoB – AM) – Presidente, teve verificação solicitada…
O SR. PRESIDENTE (João Alberto Souza. PMDB – MA) – … desde que o acesso prejudique as investigações.
A SRª VANESSA GRAZZIOTIN (Bloco Parlamentar Democracia e Cidadania/PCdoB – AM) – … com o apoiamento suficiente, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (João Alberto Souza. PMDB – MA) – Parecer nº 95, de 2017, da CCJ, Relator: Senador João Capiberibe, favorável ao projeto com a Emenda nº 1 da CCJ, de redação, que apresenta.
A matéria foi incluída na Ordem do Dia, nos termos do Recurso nº 14, de 2017.
O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB – PR) – Presidente, entregar o espaço aéreo brasileiro no tapetão, não.
As notas taquigráficas demonstram inequivocamente que havia 6 (seis) senadores em plenário. Um deles, o impetrado João Alberto (PMDB/MA) que presidia a sessão. Os outros cinco insurgiram-se contra a “apreciação” da matéria da maneira afrontosa à Constituição Federal, em claro desrespeito ao quórum estabelecido no art. 47 da CR, e pediram verificação de votação:
- O senador Roberto Requião pediu verificação de votação
- quatro senadores apoiaram o pedido: os senadores Paulo Paim, Vanessa Grazziotin, Lindbergh Farias e Benedito de Lira, sendo que
- o senador Benedito de Lira apoiou o pedido de verificação com a expressão “há sim“, com a qual contradisse a afirmação do presidente da Sessão de que não havia o apoiamento necessário, somando-se, dessa forma, aos outros três apoiadores:
O SR. PRESIDENTE (João Alberto Souza. PMDB – MA) – Não tivemos o apoiamento.
O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB – PR) – Temos apoiamento, sim.
O SR. PRESIDENTE (João Alberto Souza. PMDB – MA) – Precisaria de V. Exª e mais três, e nós não tivemos.
O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB – PR) – Senador Paim, Vanessa.
O SR. PRESIDENTE (João Alberto Souza. PMDB – MA) – Item nº 9.
Aprovado o projeto.
Item nº 9.
O SR. BENEDITO DE LIRA (Bloco Parlamentar Democracia Progressista/PP – AL) – Há, sim.
Logo, está claramente demonstrado que houve o apoiamento necessário – na verdade, houve mais do que o necessário – para que a verificação de votação fosse realizada. Mas isso implicaria não aprovar naquele momento o malfadado acordo de tráfego aéreo com os Estados Unidos. E havia uma inexplicável obsessão em fazê-lo.
A determinação constitucional do art. 47 da CR, que estabelece o quórum para as deliberações do Congresso Nacional e de cada uma das suas Casas, expressa-se no Regimento Interno do Senado Federal em dispositivos que foram claramente violados no processo legislativo da fatídica sessão do dia 7 de março.
Vejamos:
Art. 293. No processo simbólico observar-se-ão as seguintes normas:
I – os Senadores que aprovarem a matéria deverão permanecer sentados, levantando-se os que votarem pela rejeição;
II – o voto dos líderes representará o de seus liderados presentes, permitida a declaração de voto em documento escrito a ser encaminhado à Mesa para publicação;
III – se for requerida verificação da votação, será ela repetida pelo processo nominal;
IV – o requerimento de verificação de votação só será admissível se apoiado por três Senadores;
V – procedida a verificação de votação e constatada a existência de número, não será permitida nova verificação antes do decurso de uma hora;
VI – não será admitido requerimento de verificação se a Presidência já houver anunciado a matéria seguinte;
VII – antes de anunciado o resultado, será lícito tomar o voto do Senador que penetrar no recinto após a votação;
VIII – verificada a falta de quorum, o Presidente suspenderá a sessão, fazendo acionar as campainhas durante dez minutos, após o que esta será reaberta, procedendo-se a nova votação;
IX – confirmada a falta de número, ficará adiada a votação, que será reiniciada ao voltar a matéria à deliberação do Plenário;
X – se, ao processar-se a verificação, os requerentes não estiverem presentes ou deixarem de votar, considerar-se-á como tendo dela desistido.
(grifamos)
O respeito ao artigo 47 da Constituição Federal exigia do presidente da Mesa da referida sessão do Senado Federal que lhe desse a aplicação prevista no art. 288 e nos incisos III e IV do art. 293. Afinal, apresentado, como foi, o pedido de verificação pelo senador Roberto Requião e apoiada por quatro senadores (uma mais do que o número mínimo: senadores Vanessa Grazziotin, Lindbergh Farias e Paulo Paim e Benedito de Lira), estavam cumpridos os requisitos regimentais para o cumprimento do referido constitucional de quórum de deliberação.
Violação do princípio constitucional da publicidade e do princípio democrático
A essas duas violações da Constituição Federal na atabalhoada tramitação do PDS 5/2018, vem somar-se uma terceira, que fere o princípio constitucional da publicidade, e, via de consequência, o princípio democrático. A Ordem do Dia é divulgada por avulsos eletrônicos aos senhores senadores e senhoras senadoras. Na publicação que antecedeu a sessão do dia 7 de março (doc. anexo), o PDS 5, de 2018, encontrava-se na 7ª (sétima) posição da Ordem do Dia.
Em desrespeito à exigência de deliberação do Senado para alteração da sequência dos trabalhos (art. 175, IV, do RISF), o PDS 5/2018 foi colocado em discussão e votação como primeiro item da Ordem do Dia (doc. anexo). E, como um relâmpago, sem discussão, nem votação, foi “aprovado”. No tropel obsessivo e desvairado restou pisoteada a Constituição Federal no seu art. 47, como também os dispositivos regimentais que lhe dão concreção, em especial o art. 288 e art. 293, III e IV.
Tal alteração manu militari da sequência dos trabalhos fere o princípio da publicidade e o princípio democrático, ambos de hierarquia constitucional e que o Regimento Interno do Senado consagra expressamente:
Art. 175. A sequência dos trabalhos da Ordem do Dia não poderá ser alterada senão:
I – para posse de Senador;
II – para leitura de mensagem, ofício ou documento sobre matéria urgente;
III – para pedido de urgência nos casos do art. 336, I;
IV – em virtude de deliberação do Senado, no sentido de adiamento ou inversão da Ordem do Dia;
V – pela retirada de qualquer matéria, para cumprimento de despacho, correção de erro ou omissão no avulso eletrônico e para sanar falhas de instrução; VI – para constituição de série, em caso de votação secreta;
VII – nos casos previstos no art. 304
Desnecessário dizer que o respeito à sequência dos trabalhos divulgada com antecedência aos senadores é matéria de índole constitucional que se suporta no princípio da publicidade e no princípio democrático. Diferentemente dos órgãos colegiados judiciais, os colegiados legislativos, bem assim o Senado Federal, funcionam paralela e simultaneamente com outras tantas atividades parlamentares: reuniões com autoridades (Ministros, Presidente da República), atendimento à comunidade nos gabinetes (prefeitos, deputados estaduais, deputados federais, representantes de interesses econômicos e sociais, bases eleitorais).
A ordem em que os projetos são colocados na ordem do dia orienta os parlamentares no cumprimento dos seus outros compromissos. Projetos em relação aos quais há consenso ou que não suscitam grande indagação são votados pelo processo simbólico, com participação ou não dos líderes partidários. Os parlamentares podem, então, dedicar-se às outras atividades inerentes ao mandato. Quando inicia a discussão de um projeto mais polêmico, os líderes convocam os seus liderados para que compareçam ao plenário. É assim e sempre foi assim.
Por isso, a sequência em que se desenvolvem os trabalhos é matéria de alta relevância política. Não é por outra razão que requerimento de inversão de pauta de uma determinada matéria é, por vezes, objeto de acirrada e acerba discussão e contradição.
Por isso mesmo é que, em respeito ao princípio da colegialidade, derivado diretamente do princípio democrático, de índole constitucional, é que Regimento Interno prevê que a sequência dos trabalhos da Ordem do Dia não poderá ser alterada senão em virtude de deliberação do Senado, no sentido de adiamento ou inversão da Ordem do Dia (art. 175, IV, do Regimento Interno).
São essas, portanto, as três graves violações constitucionais perpetradas contra as prerrogativas dos senadores, contra as minorias parlamentares e contra o regular funcionamento do Poder Legislativo na tramitação do PDS 5/2018.
Periculum in mora
A ficha de tramitação do PDS 5/2018 revela que o impetrado Presidente do Senado Federal, no exercício da competência que lhe atribui o art. 48, XXVIII do Regimento Interno, está por promulgar o decreto legislativo a qualquer momento. Aí está, portanto, límpido, o perigo na demora na concessão da segurança. A promulgação aperfeiçoará – ainda que aparentemente – o processo legislativo do PDS 5/2018, tendo-se por ratificada congressualmente a celebração do acordo com os Estados Unidos da América. O passo seguinte será a edição de Decreto pelo Presidente da República, no exercício da competência do art. 84, VII (poderes implícitos) e VIII da Constituição Federal, ratificando o tratado.
Maculado como está por afrontar a Constituição o processo legislativo de sua apreciação, a norma que dele resultará será inapelavelmente objeto de impugnação judicial, com lamentáveis prejuízos para a segurança jurídica e para a posição do Brasil nas suas relações externas.
Ademais, a produção de norma legal – já que os tratados incorporam-se no direito pátrio com o status de lei ordinária – que surja eivada de ilegalidades na sua feitura fere todo o ordenamento jurídico e macula a ordem democrática.
Tais prejuízos podem e devem ser evitados pela concessão de liminar que suste sua promulgação e publicação no Diário Oficial da União, bem assim determine a devolução da apreciação da matéria à Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional.
Um fato ocorrido na sessão do dia 13 de março de 2018 merece ser relatado e analisado pelo que representa para a configuração do perigo na demora. O senador Lindbergh Farias apresentou questão de ordem a respeito da matéria do presente mandado de segurança, como se vê pelas notas taquigráficas anexas. O Presidente da Mesa, senador Eunício Oliveira, recolheu a questão de ordem e sobre ela irá se manifestar posteriormente. [3]
O perigo na demora não está afastado pela apresentação da questão de ordem, nem pela manifestação do Presidente do Senado a seu respeito. É que não há regra no Regimento Interno do Senado que dê efeito suspensivo a questão de ordem. A única hipótese de suspensão da tramitação se dá quando da resposta a questão de ordem é oferecido recurso ao Plenário e o presidente do Senado, sponte sua, resolve consultar a Comissão de Constituição e Justiça a respeito. É a letra do art. 408 do Regimento Interno:
Art. 408. Havendo recurso para o Plenário, sobre decisão da Presidência em questão de ordem, é lícito a esta solicitar a audiência da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania sobre a matéria, quando se tratar de interpretação de texto constitucional.
- 1º Solicitada a audiência, fica sobrestada a decisão.
Logo, é perfeitamente possível, e mesmo previsível, que o Presidente do Senado responda negativamente à questão de ordem no sentido de afirmar a constitucionalidade, legalidade e regimentalidade da aprovação da matéria e no mesmo dia promulgue o decreto legislativo e remeta-o à publicação.
Por essa razão, a apresentação da questão de ordem em nada altera a situação de perigo que os impetrantes pretendem debelar através da medida liminar pleiteada.
Inexistência de dano reverso
A concessão da liminar e, ao final, da segurança não acarreta qualquer prejuízo para o Senado Federal ou para a União. Não há, como já se disse, qualquer prazo em curso para que o referido acordo internacional seja ratificado pelo Brasil. Ademais, não há risco de prejuízo para o processo legislativo com a oitiva da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional. Antes, pelo contrário, há ganho de transparência e densidade informativa no processo de ratificação do tratado.
A relevância da matéria
A presente impetração não é um capricho, nem um ato de oposição política ou partidária de natureza conjuntural. A par da defesa do direito constitucional das minorias ao devido processo parlamentar, o que está em jogo no presente processo é o futuro do Brasil e o uso do nosso espaço aéreo para transporte de passageiros e cargas. Para não alongar a presente petição com considerações de natureza material, os impetrantes pedem atenção de Vossa Excelência para o artigo “A soberania foi para o espaço”, assinado pelo senador Roberto Requião, Presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Soberania Nacional, que passa a fazer parte integrante das razões que fundam o pedido.
Com a palavra, enfim, a Suprema Corte do Brasil. Que o seu pronunciamento, que sua palavra, honre a história e o futuro da Nação. Que ecoe em seus ouvidos a voz que clama através dos séculos nas palavras do Padre Antonio Vieira:
Ministros da República, da Justiça, da Guerra, do Estado, do Mar, da Terra: vedes as obrigações que se descarregam sobre vosso cuidado, vedes o peso que carrega sobre vossas consciências, vedes as desatenções do governo, vedes as injustiças, vedes os roubos, vedes os descaminhos, vedes os enredos, vedes as dilações, vedes os subornos, vedes as potências dos grandes e as vexações dos pequenos, vedes as lágrimas dos pobres, os clamores e gemidos de todos? Ou o vedes ou o não vedes. Se o vedes, como o não remediais? E se o não remediais, como o vedes? Estais cegos.
Padre Antônio Vieira, in “Sermões”
O pedido
Ante o até aqui exposto, requerem os senadores impetrantes:
- medida liminar inaudita altera pars, com fundamento no disposto no inciso III, do art. 7º da Lei nº 12.016/2009, para que:
a.1) seja determinado ao Presidente do Senado que:
a.1.1) abstenha-se da prática de qualquer ato no sentido de dar consequência legal à suposta e inexistente aprovação da matéria do PDS 5, de 2018, na sessão de 7 de março de 2018, inclusive a promulgação do Decreto Legislativo e sua publicação no Diário Oficial da União;
a.1.2) caso já tenha promulgado o Decreto Legislativo, que não o publique;
a.1.3) caso já tenha publicado, que promova a anulação dos atos de promulgação e publicação para que o PDS 5, de 2018, retome sua tramitação regular a fim de que se produza norma escorreita e livre de vícios de origem;
a.1.4) adote os atos necessários a restituir o processo legislativo do PDS 5, de 2018, à subordinação à Constituição Federal, inclusive no que pertine à competência da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional e ao quórum de deliberação;
- caso a promulgação e/ou publicação no Diários Oficial da União já tenham ocorrido, seja determinado ao Presidente da República abstenha-se de praticar qualquer ato no sentido de dar-lhes consequência legal e jurídica, inclusive abstendo-se da edição de decreto que aperfeiçoe a ratificação do acordo que constitui o objeto do PDS 5, de 2018;
- seja determinada a notificação das autoridades coatoras, nos termos do disposto no inciso I do art. 7º, da Lei nº 12.016/2009, para que possa, caso queiram, prestem suas informações no prazo legal de 10 (dez) dias;
- seja determinada a intimação da Advocacia Geral da União, órgão de representação judicial, para os fins do disposto no inciso II do art. 7º da Lei nº 12.016/2009;
- após a apresentação das informações da autoridade coatora, a intimação do Procurador Geral da República, para que possa emitir seu parecer, no prazo de até 10 dias, nos termos do disposto no art. 12 da Lei nº 12.016/2009;
- o deferimento da ordem de segurança para que:
f.1) seja confirmada a liminar concedida, de forma que seja reconhecido o direito dos senadores impetrantes ao devido processo legislativo do PDS 5, de 2018, inclusive para a proposição seja apreciada pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional e que sua deliberação obedeça o quórum estabelecido no art. 47 da Constituição Federal e nas normas procedimentais que lhe dão concretude no Regimento Interno do Senado Federal
f.2) sejam declarados nulos os atos do processo legislativo posteriores ao recebimento do processado na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, inclusive a aprovação do Requerimento de Urgência n. 54/2018;
Nos termos do art. 104, 1º do CPC, requer a concessão de prazo de .15 (quinze) dias para a juntada de instrumentos de procuração.
Dá-se à presente demanda o valor de R$ 1.000,00 para efeitos fiscais.
Pedem deferimento
Brasília,11 de março de 2018
[1] Art. 72. As comissões permanentes, além da Comissão Diretora, são as seguintes:
[…]
VII – Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE);
Art. 103. À Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional compete emitir parecer sobre:
I – proposições referentes aos atos e relações internacionais (Const., art. 49, I) e ao Ministério das Relações Exteriores;
II – comércio exterior;
[…]
V – Forças Armadas de terra, mar e ar, requisições militares, passagem de forças estrangeiras e sua permanência no território nacional, questões de fronteiras e limites do território nacional, espaço aéreo e marítimo, declaração de guerra e celebração de paz (Const., art. 49, II);
[2] As hipóteses de quórum diverso do estabelecido na cabeça do art. 288, nenhuma das quais aplicável à aprovação de decreto legislativo ou de ratificação de ato ou tratado internacional, são: I – por voto favorável de dois terços da composição da Casa: a) sentença condenatória nos casos previstos no art. 52, I e II, da Constituição; b) fixação de alíquotas máximas nas operações internas, para resolver conflito específico que envolva interesse de Estados e do Distrito Federal (Const., art. 155, § 2º, V, b); c) suspensão de imunidade de Senadores, durante o estado de sítio (Const., art. 53, § 8º); II – por voto favorável de três quintos da composição da Casa, proposta de emenda à Constituição (Const., art. 60, § 2º); III – por voto favorável da maioria absoluta da composição da Casa: a) projeto de lei complementar (Const., art. 69); b) exoneração, de ofício, do Procurador-Geral da República (Const., art. 52, XI); c) perda de mandato de Senador, nos casos previstos no art. 55, § 2º, da Constituição; d) aprovação de nome indicado para Ministro do Supremo Tribunal Federal (Const., art. 101, parágrafo único) para Procurador-Geral da República (Const., art. 128, § 1º); para Ministro do Superior Tribunal de Justiça (Const., art. 104, parágrafo único) e para Ministro do Tribunal Superior do Trabalho (Const., art. 111-A); e) aprovação de ato do Presidente da República que decretar o estado de defesa (Const., art. 136, § 4º); f) autorização para o Presidente da República decretar o estado de sítio (Const., art. 137, parágrafo único); g) estabelecimento de alíquotas aplicáveis às operações e prestações interestaduais e de exportação (Const., art. 155, § 2º, IV); h) estabelecimento de alíquotas mínimas nas operações internas (Const., art. 155, § 2º, V, a); i) autorização de operações de crédito que excedam o montante das despesas de capital, mediante créditos suplementares ou especiais específicos (Const. art. 167, III); j) aprovação de nome indicado para Defensor Público Geral; k) (Revogado); l) aprovação de nome indicado para o Conselho Nacional de Justiça (Const., art. 103-B, caput e § 2º); m) aprovação de nome indicado para o Conselho Nacional do Ministério Público (Const., art. 130-A, caput); IV – por voto favorável de dois quintos da composição da Casa, aprovação da não renovação da concessão ou permissão para o serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens (Const., art. 223, § 2º); V – por maioria de votos, presentes um décimo dos Senadores, nos requerimentos compreendidos no art. 215, III. § 1º A votação da redação final, em qualquer hipótese, não está sujeita a quorum qualificado. § 2º Serão computados, para efeito de quorum, os votos em branco e as abstenções verificadas nas votações.
[3] O SR. PRESIDENTE (Eunício Oliveira. PMDB – CE) – Bom, eu não estava presidindo a sessão e, portanto, não tenho condições de responder de imediato a questão de ordem de V. Exª, mas vou pedir à Secretaria-Geral da Mesa que eu quero ver repetida a sessão, para que eu possa fazer uma avaliação e responder à questão de ordem de V. Exª. (Notas taquigráficas anexas)